Dificuldades com o sono na primeira infância

Dificuldades com o sono na primeira infância

Uma queixa muito comum entre os pais com filhos pequenos é a dificuldade em ter noites tranquilas e completas de sono, afinal, muitas são as vezes necessárias para ir responder à criança que despertou ou para conduzi-la de volta ao seu quarto depois da mesma ter ido procurar os pais.

Não dormir a noite toda, durante dias, meses, ou anos, é extremamente extenuante. Há pessoas que lidam melhor, outras pior, mas, no geral, não há ninguém que não precise de um sono de qualidade. Aliás, a privação de sono é um fator de risco para várias doenças e pode causar danos não recuperáveis. Um mau sono na infância pode ter impacto na saúde e desenvolvimento, na memória e aprendizagem, na regulação emocional, no comportamento, etc. Assim, cuidar do sono dos pais e filhos é essencial!

O sono varia de pessoa para pessoa e vai mudando de acordo com a idade. As dificuldades no sono podem ter várias causas, e dar-se em diferentes momentos – ao adormecer, ao longo da noite, ao despertar… e, por isso, não existem respostas lineares, simples e únicas. As consultas do sono são assim muito importantes para perceber as especificidades de cada caso e dar-lhe a melhor resposta.

Ainda assim, é possível encontrar algumas orientações gerais. No geral, para que uma criança durma sozinha a noite toda, os seus hábitos, rotinas e necessidades emocionais devem estar equilibradas e adaptadas. Primeiramente, é muito importante que a criança tenha uma rotina de sono regular, indo dormir sempre às mesmas horas e realizando atividades calmantes antes de ir dormir. Não é recomendado que faça atividades agitadas, que encontre pessoas que não vê com frequência, que faça refeições muito pesadas ou coma doces, que visualize ecrãs, entre outros. A higiene do sono implica criar um ambiente tranquilo e de preparação para o sono antes de colocar a criança na cama.

Uma das razões pelas quais as crianças não dormem a noite toda ou estão agitadas é porque querem estar com os pais. É preciso então conversar com elas, passar algum tempo de qualidade, dando carinho e reconhecendo a vontade delas de brincar, mas combinando que depois vão dormir e que ambos precisam de dormir para terem energia para brincar juntos no dia seguinte.

Agora, se o seu filho não adormece sozinho, ou acorda muitas vezes de noite é importante perceber de que forma ele adormece. É essencial que, ao longo do tempo, o disparador de sono seja INANIMADO e não parta das suas ações. Se a criança estiver acostumada a dormir com o seu afago, ela terá muita dificuldade em conseguir adormecer sozinha, pois estará instalado um hábito e hábitos são difíceis de mudar. É provável que quando ela acordar o procure, pois precisa do mesmo disparador de sono, você, para dormir. Vai ser necessário desconstruir este hábito. Agora, caso a criança adormeça sozinha, mas acorde muitas vezes à noite a procurar por si, será preciso identificar a necessidade por trás. Se a questão é fome ou sede, se medos ou pesadelos, se necessidade da sua presença e conforto, etc. Avaliar a situação concreta do seu filho com um profissional pode ser muito útil.

Outra questão é quando a criança não quer ir dormir e testa limites. Será preciso ajudar a criança a tolerar esta frustração, validar o desejo dela de não dormir, mas encorajá-la a viver o desafio necessário de muitas vezes termos de fazer aquilo que não queremos, e ajudando-a neste processo: “Sei que não querias ir dormir, mas já está na hora. Vou estar aqui ao teu lado, podemos ler um livro a ver se chega o sono”. É importante transmitir segurança e ser consistente, não só no dia-a-dia, mas também entre cuidadores. Ler histórias sobre ir para a cama e ensinar técnicas de relaxamento, como de respiração ou de imaginação de um lugar calmo e tranquilo, também pode ajudar.

Tudo vai depender também da idade da criança. De acordo com o livro o “Sono do meu bebé”, da especialista em sono pediátrico, Dra. Andreia Neves (2021):

  • Nos primeiros 3 meses o essencial é o bebé gostar de dormir e criar uma boa relação com o sono, ir estimulando o ritmo circadiano com a luz natural pela manhã, e com a redução de luzes elétricas de noite. Dormir no escuro total de noite. O bebé não deve passar muito tempo acordado entre sestas (mais do que 1 hora).
  • Nos 3 meses seguintes já se pode começar a criar uma rotina de sono e de despertar de acordo com os sinais que o bebé vai dando. Já fica mais tempo acordado entre sestas (2 horas), e durante a noite é normal que ainda acorde para comer. É importante começar a variar as formas de adormecer, caso adormeça habitualmente a mamar. Durante a noite manter o escuro, silêncio e o mínimo de movimentos e interação possível.
  • Dos 6 aos 9 meses, normalmente há um padrão de 3 sestas, ficando o bebé acordado durante mais tempo (cerca de 3 horas) e o sono noturno tende a aumentar. Dos 9 aos 12 meses, o padrão pode passar a 2 a 3 sestas, com cerca de 4 horas acordado entre sestas. A rotina e regularidade de horários são importantes nesta fase. Com o desenvolvimento motor do bebé os sonos também se tornam mais agitados. Nesta fase é também importante que exista uma intervenção cada vez menos ativa do adulto para o bebé adormecer.
  • Entre 1 e 2 anos começa normalmente a haver uma maior estabilidade do sono, com despertares noturnos menos frequentes. O tempo acordado entre sestas é cerca de seis horas. Entre os 2 e os 5 deve manter-se uma sesta diurna, e espera-se que existam noites completas com regularidade.

Como visto, as razões para as dificuldades do sono são diferentes, sendo necessário identificá-las para responder da melhor maneira. Em suma:

  • Mantenha uma rotina de preparação para o sono tranquilizadora e previsível (pode incluir contar uma história, um banho quentinho, ouvir música de dormir, etc.) e evite situações estimulantes (receber visitas, ver a ecrãs, fazer brincadeiras agitadas, entre outros).
  • Garanta que o disparador do sono do seu filho é um estímulo inanimado, substituindo-o gradualmente caso o seu filho dependa de si para dormir.
  • Tenha em atenção e consideração as necessidades do seu filho, valide-as, mas seja claro: há hora de dormir e há hora de brincar.
  • Garanta que todos os cuidadores estão de acordo e são consistentes na forma de gerir as regras e condições para o sono da criança.
Ana Lúcia Senise

Ana Lúcia Senise

  • Licenciada em Psicologia (Universidade de São Paulo)
  • Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde (Universidade Católica Portuguesa de Lisboa)
  • Psicóloga estagiária na associação Caminhos da Infância

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